Responsabilidades dos Riscos de Desastres ou Tragédias

Conforme Dr. José Carlos de Freitas, 1º Promotor de Justiça de Habitação e Urbanismo da Capital/SP, em seu trabalho apresentado no III SIBRADEN – Simpósio Brasileiro de Desastres Naturais e 13º Congresso Brasileiro de Geologia de Engenharia e Ambiental, em 2 a 6 de novembro de 2011, em São Paulo / SP, conceitua o que são desastres naturais e tragédia (drama), como sendo:

Desastres Naturais: terremotos, tsunamis, furacões, vulcões, nevascas, avalanches, inundações, secas, ondas de calor (“o Brasil é um país tropical abençoado por Deus”)

Tragédia (drama): calamidade, desgraça, catástrofe, fatalidade, infortúnio ou flagelo humano, relacionado com as forças da natureza e/ou decorrentes da ação do homem (ocupação irregular do solo – deslizamentos, desmoronamentos, inundações etc.)

Dr. Freitas explica que a Constituição Federal (CF) tutela do direito à vida e à integridade física das pessoas (art. 5º, caput, CF); que municípios têm competência constitucional para promover o adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, ocupação e parcelamento do solo urbano (art. 30, VIII, CF) e que a Lei 12.340, de 01.12.2010 – Sistema Nacional de Defesa Civil – SINDEC – transferências de recursos para ações de socorro, assistência às vítimas, restabelecimento de serviços essenciais e reconstrução de áreas atingidas por desastres, conferindo atribuições e responsabilidades ao Governo Federal, Estados e Municípios

Segundo a Lei supracitada, cabe aos municípios o dever de mapear as áreas; elaborar plano de contingência e núcleos de defesa civil; elaborar plano de implantação de obras e serviços para a redução dos riscos; fiscalizar a edificação em áreas com esses riscos; elaborar carta geotécnica de aptidão à urbanização (art. 3º, par. 2º); reduzir o risco, executar plano de contingência, obras de segurança e remoções com reassentamento (vistoria + laudo técnico + notificação + alternativas para assegurar o direito à moradia + impedir a reocupação das áreas – art. 3º-B, par. 1º).

Dr. Freitas ainda ressalta sobre as responsabilidades:

Responsabilidade objetiva do Poder Público – art. 37, par. 6º, CF, com direito de regresso contra agente, por dolo ou culpa;

Responsabilidade por improbidade administrativa – Lei 8.429/92 – perda do cargo ou do mandato, pagamento de indenização, reparação do dano, perda de direitos políticos (votar e ser votado);

Quando se justificar, caberá ao Ministério Público (MP) a Ação Civil Pública sobre as questões legais supra relacionadas.

Ressaltamos que são as chuvas intensas ou excepcionais que deflagram os deslizamentos dos solos, causam as inundações, erosões e assoreamentos, entre outras patologias originadas pela infiltração, inundação e umedecimentos dos solos.

Dentro deste contexto, gostaríamos de esclarecer um argumento pouco técnico e/ou pouco sustentável juridicamente e/ou nas responsabilidades pelas companhias de seguros – trata-se  das chuvas (intensas, excepcionais ou não) – que  poderão provocar infiltrações, inundações, deslizamentos de solos e etc.

Esta argumentação de que “choveu muito”, muitas vezes, pode não ter sustentação técnica, pois quase sempre poderiam ser previstas.

A ideia, insustentável, é que as chuvas intensas justificariam as inundações e deslizamentos de solos, erosões e assoreamentos, pois não poderiam ser previstas e, portanto deram causa aos acidentes, desastres e patologias. Não havendo responsáveis para aquela tragédia ocasionada pelas tais chuvas.

Acontece-se que as chuvas, o lençóis de água subterrâneos, e umidade e resistências dos solos podem ser perfeitamente previsíveis. São variáveis sobejamente conhecidas pela engenharia civil. Que pese as incertezas envolvidas no conhecimento destas variáveis. Mas, fazem parte do trabalho do engenheiro civil, sendo de sua responsabilidade o conhecimento, dispersão e tratamento nos cálculos de engenharia que devem promover à devida segurança a sociedade. Que pesem os riscos inerentes a qualquer evento a que o ser humano esta sujeito.

Na verdade qualquer ação humana sobre o meio físico – por exemplo: obra de terraplenagem, drenagem, pavimentação, canalização ou qualquer edificação – apenas poderá se realizar legalmente se houver um Responsável Técnico, atribuição esta dada ao Engenheiro Civil, devidamente regulamentado pelo CREA.

Ou seja, o Engenheiro Civil é o responsável por qualquer obra – ação do homem sobre o meio físico

Pois, recebeu na escola de engenharia orientação de como coletar informações, considerar as variáveis no cálculo e dimensionar os elementos de engenharia – por  exemplo, as chuvas intensas ou excepcionais – para que estas obras conferissem a devida segurança para a sociedade.

De outra forma podemos esclarecer que o engenheiro civil tem a responsabilidade de considerar os cenários, modelos de cálculo e mecanismos de ruptura conhecidos pela sociedade especializada (denominamos estado da arte), ou seja, os conhecimentos atualmente existentes sobre sua especificidade é de sua responsabilidade. Exatamente, pela enormidade de conhecimento existente, que existem as especializações como: engenheiro geotécnico, geólogo de engenharia, entre outros.

Portanto, não caberá ao engenheiro civil a argumentação de não poder prever. Ou seja, que foi um imprevisível, caso haja conhecimento sobre o fato transcorrido. O imprevisto representa uma coisa que poderia ser prevista (era previsível) neste caso a responsabilidade é do engenheiro civil.

As chuvas são previsíveis e não podem ser pretexto para considerá-la imprevisível. Caso um acidente, tragédia ou desastre tenha sido ocasionado pelas chuvas e estas poderiam ser previsíveis e, não foram. Este imprevisto é responsabilidade do engenheiro civil.

Exceção será o caso em que o evento tenha sido deflagrado, ou seja, decorrente de algo que a sociedade especializada e responsável socialmente não tenha conhecimento anterior ou seja, não poderia ser previsível.

Finalizando, o Poder Público tem suas responsabilidades e este apenas pode agir sob a responsabilidade do engenheiro civil, pois é este o profissional devidamente habilitado para responder e garantir à devida segurança à sociedade que pesem os riscos sempre envolvidos. Pois não há uma garantia, mas sim um risco aceito pela sociedade. Cabe ao engenheiro civil a decisão sobre os riscos envolvidos, conferindo-lhes um nível de probabilidade de insucesso adequado ao evento.

Ou seja, ninguém pode garantir que estaremos vivos na próxima meia hora e também que não entrará um avião pela janela de nossa casa. Porém, a probabilidade é remotíssima e estamos devidamente “seguros”.

Assim para que as demandas jurídicas não ocorram, dever-se-á considerar as boas práticas da engenharia civil com suas especificidades com hidrologia, hidráulica, geotecnia e geologia de engenharia.

 

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